sexta-feira, 24 de maio de 2019

Lisboa, 23 de Outubro de 1915: Fernando Pessoa a John Lane

Lisboa, 23rd. October 1915

Sir,

I am sending you with this letter copies of sixteen poems of mine, fifteen of which are representative of the work contained in a book of English poems which I find myself to have written.
Putting aside for the moment the opinion I myself may form from these poems, the fact remains that I cannont, of course, have any idea, not of the objective, but of the (so to speak) temporal, value of these poems. Hence I cannot rightly measure what probabilities attach to a publication of them.
You will be the best judge of this, and, seeing that you have extensively published modern English poetry, I send you these poems as a sort of inquiry whether you would be disposed to publish a book the substance of which is precisely on the lines which these poems represent.
The book would cover about 200 pages, taking as typical page that of, say, your edition of Ernest Dowson's poems. It would include no long compositions -- none longer, I believe, than the Fiat Lux sent you. I have indeed longer poems written in English, but these could not be printed in a country there is na active public morality; so I do not think of mentioning them in this respect -- that is to say, in respect of a possibility of their being published in England.
The circumstances attending first-hand criticism have in all times been so uncertain, that I hope you will no be offended if I ask you to read the poems more than once, or so to have them read. Their chieg merit, if they have one, is precisely in that they do no enter into the stream of any current poetical movement -- except, perhaps, the Portuguese «sensationist» movement, of which I am the leader --; so that, the more cultured and educated the critic of them is,  the more likely he is to find a pitfall for is judgement, for the less improbable is it that his mind is already herdened in a definite mould.»
These poems contain, here and there, certain eccentricities and peculiarities of expression; do not atribute these to the circumstance of my being a foreigner, nor indeed consider me a foreigner in your judgement of these poems. I pratice the same thing, to a far higher degree, in Portuguese. If, however, you prefer to consider these modes or strangeness as the wild cats of the imagination, I hope you will let me lay claim to sowing them consciously.
The fact is that these are forms of expression necessarily created by na extreme pantheistic attitude, which, as it breaks the limits of definite thought, so must violate the rules of logical meaning. The poems I am sending (and the others I have referred to) are, however, the mildest in this sense; I spare you all special reference to the poems which properly represente what I cal the «sensationist attitude», save that, to give you some idea of the thing meant, I add to the fifteen poems a sensationist poem in English. This, as stated, does not belong to the book.
Please adress your reply to: Fernando Pessoa -- Director de «Orpheu» -- Rua do Ouro, 196 -- Lisboa.
Awaiting with much interest your opinion, and thanking you for it in advance, I am, Sir,
Yours faithfuly,

Mr. John Lane,
Publisher,
London.

nota - Fernando Pessoa, Correspondência Inédita, edição de Manuela Parreira da Silva (Lisboa, Livros Horizonte, 1996). A carta a Lane (1854-1925) insere-se no propósito de Pessoa em levar o seu «sensacionismo» a cruzar a fronteira (ver). ).

 

sexta-feira, 10 de maio de 2019

30 de Julho de 1867: Camilo Castelo Branco a Eduardo Costa Santos

Meu amigo:

D. Ana e eu lhe agradecemos mui cordialmente a oferta de um laborioso e utilíssimo trabalho. Na 2.ª edição do «Cavar em Ruínas», se se fizer em minha vida, farei menção da nota do meu amigo.
A maior parte dos livros que me propõe em troca, a tenho nas Memórias da Academia. Outros, afora aqueles, já os possuo, e alguns não interessam ao género dos meus estudos. Relativamente aos abatimentos, que o meu amigo faz aos livros que por aí tenho, são eles tamanhos que não os aceitaria eu. É certo que autorizei o Eduardo a abater, mas com abatimento também da percentagem que lhe designei. Sem isso não terão eles tão desgraçado fim. Prefiro recolhê-los porque merecem mais alguma estima. Do seu muito amigo

30 de Julho 67.

Camilo Castelo Branco






nota - publicado por António Cabral, Homens e Episódios Inolvidáveis (1947), que identifica o destinatário, um dos editores de Camilo, embora com reservas. É possível que a carta tenha que ver com um dos leilões da sua livraria.

domingo, 5 de maio de 2019

Caminha, 1 de Janeiro de 1923: Luciano Pereira da Silva a Joaquim de Carvalho

Meu prezado Amigo:

Recebi a sua carta que lhe agradeço. A respeito do original do Hümmerich, não se lhe pode exigir que o mande dactilografado, pelo menos este primeiro trabalho que ele tem pronto, e está copiado pela senhora dele, com certeza com m.to boa letra para ir para a imprensa. Ele escreve sempre em letra m.to legível, e com certeza o original vem assim. Eu lerei ao compositor a primeira, ou as primeiras páginas, e como eu assistirei à composição, e reverei as primeiras provas, isso caminhará rapidamente.
Para pedir ao Dr. Hümmerich que me mande o original, espero as suas informações sobre os caracteres sânscritos.
Pergunta-me se recebi as Cartas do R. Sanches, que eu m.to lhe agradeço. Mas mandou-mas para Caminha, ou para a minha casa de Coimbra, Palácios Confusos? Se mandou para aqui não recebi. Se mandou para os Palácios Confusos, lá me entregarão o livro, q.do eu regressar a Coimbra, onde tenciono chegar no dia 6.
Os trabalhos do Hümmerich são m.to importantes e para nós m.to interessantes, por serem relativos a coisas portuguesas.
Estive agora com um professor do Liceu de Braga, natural deste concelho, amador e negociador de coisas antigas, e possuidor de livros e pergaminhos. Falou-me de uns manuscritos, que apanhou em Braga, e eu propus-lhe que lhos mandasse (sendo eu o portador, q.do puder ser), para serem publicados, se tiverem valor, sendo-lhe depois restituídos a ele. Não foi fora disso. Eu disse-lhe isto, pensando na sua projectada publicação. Quem sabe se ele terá coisa de valor, inédita, é claro! Será bom ver.
E não lhe tiro mais tempo. Disponha do que é, com especial estima,

Seu amigo certo e m.to grato

Caminha, 1.I.23

Luciano Pereira da Silva

P. S. Agora mesmo recebo da mão do carteiro, as Cartas. M.to e m.to obrigado, pelo seu presente de Ano Novo. tive de rasgar o envelope da carta, para introduzir este grato suplemento.

nota - Correspondência de Luciano Pereira da Silva para Joaquim de Carvalho, introdução e notas por José Barbosa, separata, do Bol. Bibl. Univ. Coimbra, vol. 39 - 1984, Coimbra, 1985. Matemático e historiador da náutica dos Descobrimentos, Luciano Pereira da Silva (1864-1926) faz a ponte entre Franz Hümmerich, autor, entre outros, dum estudo sobre o roteiro da viagem de Vasco da Gama, para a sua publicação na Revista da Universidade de Coimbra, dirigida por Joaquim de Carvalho. A referência bibliográfica a Ribeiro Sanches: Cartas Sobre a Educação da Mocidade (1760), publicadas no ano anterior pela Imprensa da Universidade, com edição de Maximiano de Lemos.